12/09/2021

Serviço de Mingau da Cachinhos Dourados

Eu estive acompanhando muitos mangás shoujo ultimamente, e por meio deles foi que surgiu a inspiração pra escrever essa oneshot fofinha. Espero que a apreciem.
Ah! E por se passar na Coreia do Sul, há muitas expressões em coreano, as quais eu coloquei a tradução nas notas finais.
골디락스 죽 서비스 
[Oneshot] 
 ♨🏡🍜 
 “Reza a lenda que a garotinha de cabelos loiros nunca esqueceu o sabor de cada mingau provado.” 

Pique a cebola e a cenoura em cubinhos bem pequenos, e depois as deixe refogar junto com o alho em fogo baixo. Em seguida acrescente o repolho, as batatas e o chuchu. — a moça pacientemente instruía seu aluno, que naquele momento esforçava-se em seguir o que lhe foi dito. 

 — Sim, Sunbae¹!! — respondeu de pronto, pegando desajeitadamente uma faca e tentando, sem sucesso, picar os legumes. Nunca imaginara que fazer um simples mingau de arroz pudesse ser tão difícil! 

— Ainda estão muito grandes. Precisam ser menores. — ela observou analiticamente com as mãos na cintura.

— Desse jeito? — exibiu o trabalho recém-feito com expectativa; a mulher meneou negativamente. 

Desse jeito! — prontamente segurou a base da faca acima da mão de seu aluno e guiou-o com sua ajuda, fazendo desta vez cortes pequenos e bem simétricos. — Acha que agora consegue? — questionou afavelmente. 

— S-sim, kamsahamnida². — curvou-se repetidamente, ainda nervoso; ela achou fofo.

— Você só precisa praticar mais, Jungkook. Com o tempo você vai conseguir fazer tudo isso bem rápido. — sorriu, dando-lhe um tapinha motivacional no ombro.

— Eu espero que sim. — disse, evidenciando a própria insegurança e constrangimento.

— Bem, agora eu vou cozinhar também, ok? — ele assentiu. — Se precisar de ajuda é só me chamar. — disse prestativamente; ele anuiu.

Kang Dae Min seguiu em direção à outra bancada, detendo-se em cortar os cogumelos, alhos-poró e abobrinhas que fariam parte da receita. Vez ou outra virava o rosto para trás, vendo como estava indo o desempenho de seu único aluno. Sim, estava dando aulas particulares a ele, um fã declarado de sua culinária.

Não fazia nem quatro meses desde que prontificou-se a ensiná-lo a cozinhar, de graça. Encontravam-se apenas uma vez por semana, tendo em vista que nos outros dias Jungkook estava ocupado na faculdade e ela trabalhando. Apesar de possuir bastante dificuldade, o garoto realmente estava determinado a aprender a cozinhar, alegando que aquela era uma questão de honra, tendo em vista que a única coisa que até então sabia preparar era lámen.

Ela deu um sorrisinho discreto, vendo que ele havia pego o jeito. Jungkook era um rapaz incrivelmente tímido, mas quando estava cozinhando sozinho, parecia tão compenetrado e sério que ninguém diria que o pobre rapaz tinha tanta insegurança — embora fosse interessante ver o quão extrovertido conseguia ser por meio das redes sociais.

Dae Min já trabalhava com gastronomia há poucos anos. Recém-formada na área, gerenciava junto com o auxílio do irmão mais novo, o serviço de mingau fundado pelos pais havia alguns anos. De segunda à sexta trabalhava junto com a família no pequeno restaurante, enquanto que aos sábados e domingos dedicava-se ao seu hobby, que nada mais era do que postar algumas receitas em seu blog intitulado Receitas da Cachinhos Dourados; plataforma na qual havia conhecido Jungkook, que afirmou que ela era a melhor culinarista de mingaus que já conhecera. Ah! Aquele elogio, em meio aos tantos outros que ele disse, amaciou tanto o seu ego, que logo quis saber de quem se tratava — era seu primeiro fã virtual, afinal de contas. Trocaram emails e depois combinaram de que ela ensinaria-o a preparar mingaus, já que moravam próximos um do outro. Estava verdadeiramente feliz quando o encontrou, no entanto, não imaginava se deparar com um rapaz tão jovem. Pelo modo que se expressou no seu post, a moça pensara que se tratava de um eloquente homem de pelo menos trinta anos, com alguma experiência na área da gastronomia. Como se equivocara! Além dele ser quatro anos mais novo que si, nem ao menos sabia fritar um mísero ovo, fora que também não conversava muito. Jungkook havia surpreendido-lhe em vários quesitos, embora em sua maior parte fossem características positivas.
No final das contas sentia-se feliz por tê-lo feito seu aluno. Era divertido tê-lo consigo e ver seu progresso a cada semana.

Sunbae, terminei. — Jungkook declarou após alguns minutos, a cozinha imersa unicamente pelo repetitivo som da faca colidindo acima da tábua de cortar.

A moça parou o que fazia e observou o trabalho feito por ele. Cada porção dos ingredientes estavam picadas com verdadeira maestria.
— Está excelente! Você aprende rápido. — sorriu cheia de orgulho; ele deu um sorrisinho tímido, sem conseguir manter contato visual por muito tempo. Dae Min então prosseguiu: — Traga-os aqui para que façamos a finalização do prato.

O rapaz obedientemente levou os elementos até o balcão oposto ao seu, de modo que ficou em pé, ao lado de sua instrutora. A dupla então deu início à montagem do prato. Jungkook seguiu à risca as instruções de Dae Min, prezando por um trabalho digno.

E ao ser concluída, a iguaria pareceu verdadeiramente apetitosa. Além de ser bastante aromática, era também rica em temperos e diversos legumes coloridos, que decoravam o prato com maestria.

— Pode experimentar. É tudo seu! — a mulher disse sorrindo largo em direção a ele, apoiada contra o balcão, referindo-se ao mingau recém-acabado. Ele se saiu tão bem!, pensava orgulhosa de seu aluno.

 — Não vai querer? É uma porção generosa. Podemos comer os dois… — propôs ele, recitando o fim da frase baixinho, estranhando a abstenção de Dae Min. Já havia virado um hábito compartilharem o mingau entre si e comerem juntos no balcão.

Komawo³, Jeon, mas não. — recusou, ajeitando a postura e ficando ereta, como se estivesse prestes a lhe contar um grandioso segredo. — Hoje eu vou sair pra jantar com alguém, então pode se servir.

Estava tão feliz por finalmente ter arranjado um cara legal para se encontrar, após longos meses sem conhecer ninguém, que só faltava sair pelas ruas saltitando e jogando flores por todos os lados.

— Hum, ok. — sorriu fraco, subitamente perdendo o interesse pela comida.

Depois daquilo, não demorou muito para que Jungkook fosse embora e Dae Min voltasse a ficar só. O sol estava perto de se pôr, constatou, vendo que era bom começar a se arrumar.

De banho já tomado e com uma toalha envolvendo seu corpo, pesquisou no guarda-roupa o que iria vestir. Não queria nada formal, mas também nada casual demais. Aquele estava sendo seu primeiro encontro em meses e desejava que tudo saísse perfeito.

No final, escolheu um vestido de poliéster amarelo pastel com delicadas estampas de gardênias brancas. A peça era de estilo romântico, e ia até pouco acima dos joelhos, que além de ser bastante confortável, também ajustava-se em sua cintura. Possuía camadas e sutis babados tanto na parte superior quanto na inferior, dando-lhe um ar divertido. Embora recobrisse boa parte de seu pescoço e de seus braços com mangas compridas e soltas, o vestido tinha cortes transversais em cada ombro, revelando-os charmosamente.

Já vestida em frente ao espelho, resolveu deixar os cabelos acastanhados soltos mesmo. Deu uma breve ajeitada na franja, passou um pouquinho de maquiagem — tudo bem discreto — e colocou pequenos brincos de argola.

Quanto aos pés, optou por sapatilhas beges simples com lacinhos.

Dae Min, analisava-se frente ao longo espelho, orgulhosa de si mesma. Havia feito um bom trabalho.

Após mais algum tempo conferindo se tudo estava ok, pegou a bolsa, despediu-se da família e saiu de casa. Um sorriso glorioso brilhando no rosto.

— Kang Dae Min, fighting⁴!! — recitou seu mantra assim que pisara na rua. 

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E era verdade que havia se dedicado ao máximo para ir naquele encontro, mas como podia lidar com tudo aquilo alegremente quando o cara com quem havia marcado de se encontrar era completamente diferente do que se mostrava no aplicativo em que o conheceu? Não tinham absolutamente nada em comum. Nada. Ele falava demais e escutava pouco. Sempre que Dae Min tentava manifestar as próprias opiniões e interesses, ele abruptamente a cortava, impondo suas convicções acima das dela. Mesmo que fosse um homem bonito, já não conseguia sentir qualquer mínima atração por ele, que como ainda pôde reparar, tinha o repugnante hábito de tagarelar enquanto comia, consequente fazendo com que os pedaços de alimento fossem cuspidos por ele e voassem bem em direção aos seus olhos. Ah, como desejava uma máscara de proteção ou, melhor ainda, um gigantesco guarda-chuva! Aquilo estava se saindo digno de uma tortura para condenados. Mal foi capaz de tocar a própria comida e, logo depois que o cara terminou de comer, não satisfeito, perguntou se podia comer a parte dela, já que, segundo ele, Dae Min não parecia estar com fome — como poderia? O pior de tudo era saber que estava gastando o seu tempo não-jantando com alguém como ele, quando poderia ter se divertido bem mais comendo mingau com Jungkook, que diferentemente dele sempre a escutava e mostrava interesse pelo que falava.

Jungkook. Ele sim estaria sendo uma boa companhia naquela noite.

— Então, quer sair comigo? — disse o homem assim que saíram do restaurante, de frente para Dae Min. — Conheço uns lugares em que podemos ficar bem à vontade… Você pode ir pra minha casa e cozinhar mingau pra mim, já que diz ser uma cozinheira tão boa. — Um sorriso libertino brincava em seu rosto, fazendo a mulher compreender muito bem o que ele queria insinuar.

— Acho melhor nos despedirmos por aqui. — ela prontamente curvou-se com educação, deixando clara a sua recusa.

— Ah, qual é! Nós mal passamos algum tempo juntos! E você praticamente não falava nada. Eu deixei de trabalhar pra ter um encontro com você hoje, sabia? — falava ele com toda a sua indignação.

Ó, sim, sem dúvidas ele era um imbecil.

— Como é que é? — ela precisou perguntar, pois estava ainda incrédula com o quão sem noção ele conseguia ser. Ela não havia falado muito justamente porque sempre que tentava ele a impedia!!

— Eu deixei de ganhar dinheiro pra me encontrar com uma desconhecida antipática. Não acha que tenho todo o direito de estar zangado?!

A morena então fechou os olhos e respirou profundamente. Estalou a língua e deu uma breve coçadinha no nariz, o que indicava que já estava perdendo a paciência.

— Sinto muito por não ter correspondido às suas expectativas. — ela deu um sorrisinho falso. Não estava a fim de discutir e perder suas energias com um idiota. — Agora, se me der licença…

Quando estava caminhando, já de costas para ele, sentiu o braço ser agarrado fortemente.

Ele queria testar sua paciência!

Com a mão fechada em um punho, prestes ao ataque, ela se virou, e logo em seguida estacou, com o ar preso nos pulmões. A cena que viu ante seus olhos a fez congelar, de modo que a única coisa que conseguiu fazer foi abrir a boca em sinal de espanto.

Diante dela estava ninguém menos do que seu aluno de culinária, Jeon Jungkook. Mas não aquele garoto tímido e meigo com quem dividia as tardes aos fins de semana, mas sim um homem enfurecido que agarrava pelo colarinho o cara com quem teve o desprazer de sair, erguendo-o sem dificuldades do chão. Ele carregava um ar imponente e ameaçador, e Kang Dae Min sentiu que estava diante a outra pessoa completamente diferente da que conhecia.

— Q-Quem é você?! — o homem questionou nervoso, ante o olhar abrasador do mais novo, que não parecia ter dificuldade em erguê-lo.

Eu? Não importa quem eu sou! — A voz dele saiu assustadoramente baixa e rouca, diferenciada completamente de seu timbre costumeiro; suave e gentil. — Se você se atrever a encostar um dedo nela, eu juro que acabo com a sua raça. Entendeu? — puxou o homem ainda mais próximo ao seu rosto, os olhos adustos, que confirmavam que as palavras recém-ditas não se tratavam de uma ameaça vazia.

Dae Min que assistia a tudo sem nada dizer, de repente se viu realmente preocupada. Não desejava que Jungkook se metesse em problemas por conta de um traste como aquele.

Felizmente o homem pareceu compreender a situação delicadíssima na qual estava e balançou freneticamente a cabeça, fazendo com que o jovem soltasse o seu colarinho, embora não recuasse e permanecesse no mesmo local, observando-o com a mesma presença intimidadora.

— Aish! Eu já estou indo embora!! — respondeu o homem com petulância, fingindo não ser um covarde que temia levar um murro na cara.

Desdenhosamente passou as mãos pela camisa social, desamassando-a, e logo deu as costas para eles, murmurando alguma espécie de xingamento que não foram capazes de ouvir.

— Sunbae, você está bem? Esse canalha te fez alguma coisa? — como num passo de mágica, o garoto de voz macia e aveludada retornou, assumindo um ar preocupado enquanto observava a moça.

— Eu estou bem, não se preocupe. — ele suspirou aliviado. — O que fazia por aqui?

— Ah, eu moro aqui por perto. — respondeu, apontando um prédio específico com o queixo. — Estava voltando do mercado. — estendeu a sacola plástica que segurava, reforçando o que acabara de dizer. — Tinha te visto e decidi cumprimentá-la, mas fiquei preocupado quando o vi te agarrando daquele jeito. — explicou, evidenciando com o olhar a raiva que sentira.

— E posso saber onde que você aprendeu a falar daquele modo? — indagou a morena, assumindo um ar um pouco mais descontraído, cruzando os braços, sem disfarçar toda a admiração e orgulho que possuía dele. Seu herói.

Ante àquelas palavras, o garoto ruborizou exuberantemente, o que fez com que Dae Min novamente se questionasse como podia um ser tão meigo ter mudado tanto naqueles poucos segundos.

— E-eu estava com muita raiva… — encarou o chão, à procura de sintetizar seus pensamentos da melhor maneira possível. — À-Às vezes eu acabo reagindo desse jeito… — ergueu o rosto, parecendo mais certo quanto ao que dizer. — Não gosto de ver esse tipo de situação sem fazer nada. — concluiu, fazendo uma expressão que embora fosse séria, aos olhos de Dae Min pareceu adorável.

Nunca passara por sua cabeça que Jungkook pudesse ser tão valente. Muitas vezes o imaginara como um garoto tão frágil quanto um coelhinho de pelúcia, incapaz de mostrar qualquer reação defensiva. Saber que ele sabia se impor e driblar toda a insegurança que possuía em momentos tão cruciais, a fez sentir um bem estar indescritível. Era muito mais do que orgulho, mas não sabia precisar ao certo que forte sentimento era aquele, que a aquecia por completo.

E ali, frente a ele, Dae Min sorriu; doce.

— Entendi. — falou compreensivamente, sabendo que ele já estava desconfortável o suficiente.

Jungkook sentia todo o rosto queimar, quase que dolorosamente. Todavia, ante àquele sorriso tão lindo, foi preenchido com uma alegria tão forte e acolhedora, que se sentiu mais seguro e confiante; o suficiente para que fosse capaz de exibir um sorriso tão sincero quanto aquele que lhe era direcionado.

E Dae Min sentiu que todo o ar que ali havia era pouco. Pouco demais para seus pulmões que, de uma hora para a outra, resolveram esquecer sua principal função. Todo o seu corpo parecia em transe, e tudo o que era capaz de processar em seu cérebro era a imagem do garoto frente a si, que sorria de um modo nunca antes visto por ela. Pensou sinceramente estar de frente a um anjo, pois era um sorriso tão lindo e etéreo que seria capaz de arrebatá-la para bem longe, num lugar rodeado por flores e borboletas.

TUMTUM, TUMTUM!! Por que de repente seu coração estava tão acelerado?

Sem que se desse conta, percorreu os olhos por todo ele, como se, pela primeira vez em todas aquelas semanas, desde que se conheceram, de fato o estivesse analisando com precisão.

Os lustrosos fios castanho escuro alinhavam-se acima de sua cabeça e desciam por sua testa, repartindo-se numa franja diagonal que graciosamente cobria parte de suas sobrancelhas. A tez era iluminada pela luz oriunda do poste, que delineava majestosamente todos os seus contornos, evidenciando a ponta de seu nariz e as linhas que compunham seu atraente maxilar. Em meio ao largo sorriso que esticava seus lábios e expunha seus dentes longos e brancos, seus olhos de cor ônix curvavam-se de maneira adorável.

E de uma hora para outra, Kang Dae Min sentiu-se incrivelmente atraída por ele. Tudo nele lhe pareceu cativante, e aquilo a fez se perguntar como, desde que o conhecera, nunca havia se atentado a ele. Nunca o achara feio ou coisa parecida — achava-o fofo, na verdade —, mas sempre o encarara como uma pessoa de aparência relativamente comum, sem nada de especial ou marcante. Quase sempre trajado por uma touca ou boné na cabeça e um folgado moletom, a mulher nunca teve um vislumbre de sua real essência, até vê-lo ali, parado frente a si, trajado por um longo sobretudo de tweed marrom com padrões xadrez de cor azul, que recobria a blusa de gola alta cor índigo e calça jeans clara que compunham seu visual; uma imagem que trazia-lhe conforto e amparo, contrastando com o frio que naquele momento sentia por estar usando um vestido fino demais para uma noite como aquela.

Permaneceu aferventando pensamentos e dúvidas quanto ao porquê de estar tão ansiosa, até que finalmente decidiram sair dali e resolveram se sentar no banco da praça pertencente ao pequeno prédio no qual o rapaz morava.

Jungkook era um bom observador e logo percebeu o quão arrepiada a moça estava, então num gesto de cavalheirismo que a deixou sem reação, ele prontamente removeu o casaco e o depositou acima dos ombros dela. O rosto a centímetros de distância do de Dae Min, de modo que até mesmo foi capaz de sentir a respiração quente dele bater contra a sua bochecha. E novamente seu coração acelerou.

— Ah, não precisa… — murmurou sem graça, tentando remover a peça de cima de si; ele a impediu, negando com a cabeça e firmando a peça no local em que havia colocado.

— Está fazendo frio. — argumentou laconicamente. A voz soou rouca; máscula.

Komawo… — disse ela, agradecida pela consideração que ele demonstrava ter por ela. Já se sentia muito melhor, agora que estava protegida contra toda a frieza que precedia o inverno.

Observou o rapaz de relance, este que naquele momento observava a movimentação à sua frente. Seus olhos taciturnos refletiam a luz do poste frente a eles, e em seu semblante havia alguma cor. Ele estava constrangido, Dae Min constatou.

— Então… pelo visto você já sabe cozinhar. — ela decidiu puxar conversa, sabendo o quão difícil aquela simples tarefa era para ele. Pelo que vira através da transparência da sacola a qual o mesmo segurava, tratavam-se de alimentos para experientes na culinária, como sacos de arroz, legumes, verduras frescas e peças de carne.

O vento soprava gelado e balançava as folhas da grande árvore que sombreava por trás deles, enquanto ambos permaneciam constrangidos lado a lado, observando os veículos que iam e vinham.

— Ah! — ele deu um sorrisinho completamente sem jeito, descendo o olhar em direção às mãos cruzadas. — Eu resolvi fazer mais mingaus pra praticar.

— Não sabia que tinha tanto interesse em aprender a fazer mingaus. — comentou pensativa, observando cada uma de suas reações. — Tem algum motivo pra isso? — sorriu ao ver que ele erguia o rosto e a olhava de volta.

— Eu só... gosto de mingau. — respondeu ele. — É a minha comida preferida… — confessou baixinho, um pouco envergonhado por saber o quão infantil aquilo soava.

— Também é a minha comida preferida! — ela afirmou efusivamente e logo em seguida riu, achando graça daquela coincidência. — Sabe, eu sempre amei a história da Cachinhos Dourados e os três ursos, — virou-se em direção a ele, que a observava com evidente interesse. — então sempre que minha mãe lia pra mim, eu pedia que ela cozinhasse mingau pra mim. — ele sorriu largo. — Acho que é por ser uma comida tão afetiva pra mim, que eu gosto tanto, que resolvi cursar culinária e ajudar meus pais no restaurante.

Omo!! Eu também pedia que minha mãe cozinhasse pra mim depois de ler!! — disse ele num tom mais elevado, os olhos cheios de animação ao constatar que não foi a única criança que tivera aquele desejo.

E assim ambos começaram a rir de tudo aquilo, vendo o quão infantis podiam ser, indo ao ponto de elegerem sua comida preferida com base em um sentimento que um famoso conto de dormir os transmitiu.

Se de algum modo havia alguma barreira entre eles, instantaneamente ela foi rompida. Um assunto foi levando a outro e quando viram, já não estavam mais acanhados em conversar sobre o que quer que fosse, o que foi incrivelmente vantajoso para Dae Min, que descobriu mais sobre Jungkook, que até então quase nada sabia. O moreno revelou ser um estudante de engenharia e jiu-jitsu apaixonado por filmes de terror e faroeste, e por bandas de rock'n'roll desconhecidas, além de ser um grande fã das obras de Sidney Sheldon. Era engraçado saber daquilo, pois destoava completamente da imagem que fazia dele. Jurava que o garoto era um geek estudante de design ou fotografia, que por conta da timidez, fugia de adrenalina e agitação. A única coisa que de fato estava certa todo aquele tempo, era quanto à sua inteligência avançada; ele disse conseguir resolver complexos quebra-cabeças e desafios de raciocínio lógico em pouco tempo. Era perfeito em tudo o que propunha a fazer! Superava em tudo aquilo que pensara sobre ele.

E para Jungkook também estava sendo incrivelmente aprazível poder ouvir mais a respeito de Dae Min. Mesmo que ela costumeiramente falasse abertamente sobre si durante as aulas de culinária, ainda havia muitas coisas que não sabia sobre ela, como por exemplo o fato de que a moça era ambidestra de nascença, embora tivesse preferência em usar a mão direita, ou até mesmo o fato de que ela possuía a capacidade de mexer as orelhas tal como um elefantinho — uma habilidade rara, mesmo sendo completamente inútil. Tudo o que ela lhe dizia o interessava, não importando quão bobo o assunto fosse. O modo loquaz com o qual ela articulava-se era o que mais gostava nela, principalmente quando via os olhos dela brilharem cheios de empolgação frente a si. Era incrivelmente magnética, e não se sentir atraído por ela iria contra todas as leis da física.

— A noite está bonita. — ela murmurou serenamente, após ficarem imersos num silêncio confortável, apreciando a lua crescente que parecia assisti-los de longe, lá do céu.

E o rapaz que até então observava o satélite natural, virou o rosto em direção à mulher, passando a contemplar o sorriso iluminado que adornava-lhe a face. Os olhos negros tendo refletido unicamente o rosto meigo da mulher.

Inconscientemente sorriu. Dae Min era tão linda! Naquele momento estava fazendo seu coração novamente acelerar, tal como a primeira vez em que a vira. Sim, estava apaixonado. Perdidamente apaixonado. Toda a vez que a via, sentia o coração acelerar. Era bastante retraído e torcia para não deixar transparecer tudo o que sentia, embora fosse desafiador, já que a mulher era encantadora em todos os quesitos. Quando a viu pela primeira vez, não pôde evitar o ímpeto de sorrir, já que destoava da imagem que idealizara. Era uma morena baixinha — não possuía nada de loiro e cacheado no cabelo longo — bastante divertida, espontânea, paciente, segura de si, educada e extremamente acolhedora para com ele, sempre animando-o e incentivando-o a praticar cada vez mais. Como poderia não ter se apaixonado? Ela despreocupadamente tocava em suas mãos, mal sabendo o quão acelerado deixava seu coração. Contava os dias para que pudesse revê-la. No entanto, na tarde daquele dia, um azedume consumiu seu paladar ao saber que a moça iria sair em um encontro. Não estava em posição de sentir nada, afinal de contas, nada tinham juntos, além de uma… amizade? Nem ao menos sabia se podia defini-los de tal modo. Era claramente um sentimento unilateral, e ele estava disposto a reprimi-lo, tendo em vista que Dae Min estava radiante quando lhe contou aquilo. Sentira-se frustrado mas decidiu seguir sua noite evitando a todo custo pensar nela; e que melhor modo de esquecer alguém, do que ocupando a mente? Resolveu tratar de pôr seus dotes recém-aprendidos em prática; iria cozinhar sua comida preferida, mas por não ter todos os ingredientes à disposição, resolveu fazer compras, e… Bem, no meio do caminho de volta para casa, deparou-se com um brutamontes que segurava o braço fino de Dae Min firmemente. Sentiu o sangue ferver. Quem aquele imbecil achava que era para tratá-la de tal modo? Sem pensar duas vezes, correu até ele e descontou sua fúria, agarrando-o firmemente e fazendo-o chispar dali. Podia ser tímido como fosse, mas jamais permitiria ver algum tipo de injustiça ou agressão em sua frente sem nada fazer. Não foi atoa que decidiu aprender jiu-jitsu.

E no final das contas, estava ali, junto com ela, apreciando aquele sorriso que aquecia seu coração e fazia-o sorrir como um tolo apaixonado.

Você está mais bonita, sunbae. — as palavras simplesmente saíram de sua boca, sem qualquer filtro ou desimpedimento; tal como uma pétala de rosa embalada pelo vento.

Dae Min sentiu a respiração travar e coração novamente acelerar. Ele havia lhe elogiado!! Ele disse que a achava bonita!!!

Não demorou a virar o rosto enrubescido e a se deparar com o sorriso ao qual ele lhe exibia de maneira tão álacre e serena.

Oras, não era como se nunca tivesse recebido um elogio! Tudo o que tinha que fazer era dar um sorriso gentil e agradecer. Molesa.

— Ah hahahahaha, sério?! E eu nem fiz nada muito elaborado, acredita? Quase não passei maquiagem porque sou péssima nesse tipo de coisa, e eu tenho esses sapatos já faz tanto tempo que estão meio apertados no calcanhar… — metralhou tudo aquilo de uma só vez em meio a um euforismo insano, esquecendo de falar a única coisa que de fato importava.

Jungkook pareceu se divertir com aquilo, ao que a encarava fixamente sem parar de sorrir. Não era o único que ficava constrangido com elogios, constatou.

A morena engoliu em seco, ciente do mico que estava passando.

— Você também está bonito… — Ela ciciou.

Muito, muito bonito, corrigiu-se mentalmente.

Ele deu um sorrisinho discreto, agradecido.

— Como você sabe, sunbae, — o mais novo falou após umedecer brevemente os lábios. — eu estava planejando cozinhar… — ela anuiu. — Será que você gostaria de ser minha convidada hoje à noite? — propôs sorrindo; incrivelmente galanteador.

Ela mordeu o lábio inferior, desejando sorrir.

— Ah, sim. Eu quero sim! — respondeu cheia de animação nos olhos; o garoto alargou o sorriso. 

 •♨ 골디락스 죽 서비스 🍚 •

E lá estava ela, sentada à mesa da sala do pequeno apartamento. Mantinha-se posicionada ali há mais ou menos vinte minutos, já que Jeongguk recusara-se a deixá-la colaborar consigo na cozinha, alegando que ali ela estava como visita e não como professora, portanto deveria relaxar e permitir que ele fizesse tudo sozinho, como ditam as normas da hospitalidade.

Como se aquilo fosse simples...

A garota respirou fundo ao que lhe pareceu ter sido a centésima vez só naquele minuto, tendo como resultado o alívio de sentir o cheirinho gostoso contido na sala; o cheiro masculino dele.

Ela poderia muito bem inalar aquela fragrância masculina por horas, entretanto, a fome deu as caras quando o odor perfumado mesclou-se com o da comida. Seu estômago roncou alto, sinalizando a necessidade de se alimentar naquele momento — mal havia comido no desastroso encontro.

— Ó, eu a fiz esperar muito?

Aquela voz de timbre gentil e preocupado, a fez abrir os olhos e se encolher ante o próprio constrangimento, por constatar que ele havia escutado o estrondoso som de sua barriga.

Dae Min ergueu o rosto e sorriu atarantada, meneando negativamente; o mais novo pareceu aliviado.

Calmamente um Jungkook de avental culinário saiu orgulhoso da cozinha e caminhou até ela, segurando uma pequena bandeja na qual havia duas tigelas fumegantes.

O aroma que delas exalava era fantástico.

Waaah! Você realmente caprichou. — ela declarou surpresa quando viu o depositar em sua frente o mingau de carne e vegetais⁵. — O cheiro tá maravilhoso, Jeon-ah. — sorriu.

— Espero que goste. — desejou, sorrindo tímido.

O rapaz então sentou-se do outro lado da pequena mesa e se serviu, atento quanto à reação de Dae Min, que naquele momento assoprava a colher com um vigor infantil e fazia umas dancinhas felizes, típico dela.

Ele deu um sorrisinho. Ela claramente estava com fome.

A baixinha então levou a colher em direção à boca e fechou os olhos, assumindo, quando mastigou, uma expressão enigmática que preocupou Jungkook.

Será que havia exagerado no sal ou na pimenta? 

Já praticava culinária há algum tempo, e uma das coisas que aprendera era que tudo o que cozinhamos, precisa ser provado antes de ser servido. Condimentos e temperos devem ser adicionados aos poucos, pois caso exageremos na quantidade destes, colocaremos nossa receita por água abaixo.

Tendo isso em mente, seguiu esses preceitos e cozinhou, crente de que agradaria o paladar de Dae Min e a deixaria feliz.

Bem, era o que pensava.

Os segundos estavam se passando de forma angustiante e ela nada dizia. Sentia que iria morrer de curiosidade, mas ao mesmo tempo receava uma reprovação da garota a qual queria impressionar.

Para seu grandioso alívio, o tormento se foi quando ela abriu os olhos radiantes e sorriu largo. 

Hmmmm… Tão delicioso~!! — falou musicalmente. 

Ele suspirou, leve.

— Ah, ainda bem! Pensei que tivesse odiado. — descarregou.

— Odiado? Você só pode estar brincando! — disse falastrona. — Isso aqui tá sensacional! Tá tão bem temperado e delicioso que me deixou sem reação. — sorriu meiga. — Ah! Eu tô tão feliz porque estou comendo algo que meu aluno fez sozinho. — controlou-se para não apertar as bochechas dele. — Parabéns, Jungkook, você recebeu meu selo de aprovação!! — proclamou convicta, exibindo o polegar.

Ele riu com todo aquele euforismo dela. Amava toda a animação com a qual levava a vida.

Depois que a agradeceu, observou Dae Min voltar a comer e se contorcer alegremente a cada novo mastigar. Sorrindo com aquela cena, ele finalmente se pôs a comer a refeição que fizera com tanta dedicação.

Os dois estavam frente um do outro, os braços repousando sobre a mesa e encostando-se minimamente. Gostavam daquele toque singelo.

Permaneceram daquele jeito durante todo o jantar, enquanto desfrutavam de bate-papos variados. Divertiram-se bastante, e quando viram as tigelas estavam vazias e seus estômagos cheios.

Dae Min, que permaneceu sentada por tempo considerável, recusou-se veementemente a permanecer daquele jeito; convenceu Jungkook a deixá-la ajudar a lavar a louça.

E assim, lado a lado desempenhavam aquele papel, que no final das contas parecia mais uma brincadeira entre duas crianças, já que volta e meia eles — com toda a sua maturidade — resolviam respingar água um no outro.

Ao terminarem, estavam ambos rindo de toda aquela gaiatice.

— Ah, eu me diverti tanto!! — disse ela, apoiando as costas e braços contra o balcão da pia, tal como Jungkook, que estava a poucos centímetros de distância. — Komawo, Jeon-ah! Você salvou a minha noite. — sorriu terna, virando o rosto álacre em direção a ele.

Aquele comentário por parte dela o fez olhá-la e sorrir, sentindo-se mais seguro quanto ao que planejava dizer a seguir.

— Eu também me diverti bastante com você esta noite. — alargou o sorriso; Dae Min enrijeceu, atraída por aquele rosto angelical e por aquele olhar penetrante que, até aquela noite, não sabia que ele possuía. 

Jungkook umedeceu os lábios rosados, ao que confessou com voz baixa e rouca:

— Sempre tive o sonho de cozinhar para a garota que estou a fim, e ouvi-la dizer que gostou. — esticou o sorriso. — Komawo, Noona⁶. Graças a você, ele se realizou.

Ante àquelas palavras, a mulher corou dos pés à cabeça, ainda em transe por conta daquela declaração explícita. Seu coração novamente dando sinais de sua existência, ao passo em que um sorriso bobo brincava em seu rosto.

Ó, e ele havia lhe chamado de Noona! Como poderia permanecer sã após aquele avanço grandioso? Se pudesse, sairia gritando e cantando Walking on Sunshine pela rua.

Depois de processar aquela informação, uma Dae Min vermelha como tomate, decidiu responder-lhe à altura:

Estava delicioso, Jungkook. Eu adorei. — alargou o sorriso apaixonado e eviesado.

Ambos sentiam beatitude, tal como se houvesse flores, querubins, e todos aqueles coraçõezinhos bregas, flutuando por todos os lados.

E em meio àquele clima cor-de-rosa, Dae Min foi surpreendida quando o mais novo rapidamente inclinou-se e depositou um selinho em sua boca; gesto que foi o suficiente para que perdesse o ar. 

Acho que agora somos mais do que amigos. — ele externalizou seu pensamento, exibindo um sorriso convencido.

E Jungkook foi completamente pego de surpresa quando a baixinha, que até então parecia congelada processando o recente beijo, puxou-o em direção a si e imprensou os lábios macios contra os dele de maneira mais urgente. Sem pensar muito, ele fechou os olhos e a deixou conduzir o ato.

Depois de alguns segundos a garota se afastou de sua boca e desviou os olhos, sem jeito. 

Ele riu, embora estivesse tão corado quanto ela.

— Então… Namorados? — ele perguntou esperançoso.

— Namorados. Ela sorriu de forma grandiosa.

“E reza a lenda que Dae Min e Jungkook nunca esqueceram o sabor de cada beijo por eles trocados.”



DICIONÁRIO:
Sunbae¹: Alguém que possui um grau mais elevado, como por exemplo, um chefe ou alguém que está numa série escolar mais adiantada do que a sua;

Kamsahamnida²: Versão polida do Komawo, empregada em contextos formais ou quando não temos proximidade com alguém;

Komawo³: Obrigado;

Fighting⁴: Também escrito como Hwaiting, nada mais é do que uma expressão de encorajamento. Pode significar "Você consegue!", mas dependendo do contexto, pode ser também "Boa sorte!". É bastante comum também que quem pronuncia essa palavra, faça um gesto com a mão fechada, reforçando o sentimento de ânimo;

Mingau de carne e vegetais(Soegogi-yachaejuk): Como o nome bem explica, é um mingau feito à base de carne com legumes. A receita é essa aqui, caso estejam curiosos.

Noona⁶: Modo como um garoto se refere a uma garota mais velha do que ele, podendo ser também usado para se referir a irmã mais velha. (Eu costumo ver muitos doramas, e geralmente as mulheres amam quando são chamadas desse jeito).

Achei super gostosinha de escrever essa oneshot (fiquei até com fome kkkkkk). Eu queria escrever algo que fizesse alusão, ainda que de maneira bem rasa, a algum conto infantil, e bem... O resultado foi esse romancezinho clichê aqui, com essa vibe gastronômica.
A cultura coreana é bastante rica, e acho bastante legal esses mingaus de arroz que eles fazem. Decidi então que escreveria algo que fizesse alusão ao conto da cachinhos dourados e os três ursos (eu amava quando minha mãe contava essa história quando era criança).

Você que leu até aqui, obrigada <3

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